Serpeloni's Blog
Loucos como eu

Eu quero só um pouco do amor, e fim: que reste a vontade de ter mais. Eu quero uma coleção de olhares, quero um livro ilustrado com sorrisos. Eu quero um faz de conta interminável, que a realidade me espere lá fora. Quero sapatinhos de rubi e um coração. Quero ser o que quero ser, quero sorrir quando esperam que eu chore. Quero surpresas e festas, fitas coloridas, fantasias e máscaras. Eu quero não ter de crescer, quero viajar para a terra do escapismo seguindo a segunda estrela à direita. Quero cartas de amor embrulhadas com lágrimas. Quero um arco-íris particular, que ele não seja ilusão de ótica. Quero uma lagarta fumante que me diga verdades, quero um amigo louco que fabrique chapéus. Quero morrer sabendo que vivi, quero viver com a certeza da morte. Quero não pensar em despedidas. Quero canções e estradas coloridas, histórias e contos de fada.
Quero acabar com essa vontade desesperada de viver o que não vivi. E matar a minha saudade de falar dessas coisas que só os loucos entendem.
16 days later...
É, esse foi o tempo mais longo que eu já passei de abstinência e crise na minha relação turbulenta com a criatividade.

The Wizard of Oz, Peter Pan e Alice in Wonderland. São meus livros infantis preferidos, e como esse texto fala sobre todos os meus sonhos no faz de conta, achei legal criar essa relação, então... é.
xx

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O choro de um palhaço

Eu nasci no palco. Dele, sou um mero palhaço; e, apesar disso, ser palhaço me põe acima de qualquer julgamento. Ninguém julga um palhaço, ninguém julga um brinquedo sem vida. A um palhaço, não é concedido viver.
Pois quem quer ver um palhaço a chorar? Quem se importa com um palhaço fora do palco? Quem choraria se o palhaço morresse? Mas eu também tenho cicatrizes. Dentro do meu peito de aço, por trás do meu sorriso ilusório, eu também sei sofrer.
Então sou eu, palhaço, e vou ao palco, e faço rir, e recebo aplausos que não entendem minha causa. Deslizo, rodopio, dou cambalhotas, me equilibro na minha própria mentira. Finjo ser o que nunca serei. E ninguém percebe que o meu sorriso não chega aos olhos. E acham que as lágrimas fazem parte da fantasia. Talento ou dissimulação? Pouco importa. Eu, palhaço, brinquedo da plateia. Vestido de fantasias e ilusões, pintado de imaginação. Eu sou o que a plateia não pode ser. Eu sou o que a plateia precisa que eu seja.
E precisam do meu sorriso. Não sabem a dor que isso custa, mas precisam do meu sorriso. Sou eu, palhaço, e esqueço de mim, e escondo a dor sob a máscara. Sou eu, palhaço, e sofro minha dor escondido.
Tem fim a pantomima. O show, por ora, terminou.
Volto aos bastidores, volto pra dentro de mim. E arranco a máscara. E faço limpa a minha face. E não sou mais palhaço. Sou humano, e choro.

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Conclusão final

Já sorri em meio ao caos, já chorei de felicidade. Já gritei até perder a voz. Me calei por muitas vezes. Contei os segundos, perdi a noção do tempo. Já invejei os mortos e tive pena dos que vivem. Já quis que falassem mal de mim. Achei que não merecia elogios. Brindei aos que me odiavam, ri do amor que por mim nutriam. Já banquei a insensível, já fingi chorar. Forcei o esquecimento, quis lembrar e não consegui. Já tive orgulho quando não devia. Concordei, discordei, menti. Vivi fantasias. Escrevi cartas que nunca foram entregues. Tive amores sem saber.
Aprendi que a beleza da vida está nas efemeridades. Que se uma flor nunca murchasse, não teríamos medo de perdê-la.
Entendi que a verdade depende do ponto de vista, e que a humanidade é míope.
Finalmente, percebi que o amor é o grande ladrão do mundo, e que dele somos todos reféns.

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Só enquanto eu respirar

Obrigada por estar lá, mesmo quando eu não pedi. Por estender a mão e me deixar pegar o braço. Por ser um ponto de fantasia no meio da realidade. Por me ensinar a não chorar. Por me afastar de mim. Por permitir que eu te tenha como necessário.
Você me ensinou a continuar. Continuar; nem perder nem vencer, apenas prosseguir.
Foi por você que eu suportei o peso da vida. E suporto, e vou em frente, ignorando o futuro que me espera.
Obrigada, meu anjo. Por viver comigo, por sorrir comigo, por estar comigo. Por ser.
Eu preciso de você. Mas só enquanto eu respirar.

OBS.: Esse texto vive desde 2008 no submundo do meu fichário, e eu o odeio. Postei aqui somente pra (1) poder finalmente jogar o papel fora e (2) ocupar espaço.

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Ruínas

Eu pensei que estava livre. Finalmente liberta da minha necessidade obsessiva de você.
Como eu me enganei, amor...
Um sorriso foi mais que o suficiente, mais do que eu estaria pronta para aguentar. Desencadeou uma torrente de emoções que eu pensara estarem mortas. Adormecidas, ao menos. Mas elas estiveram lá, todo esse tempo, esperando.
Eu tive raiva, amor.
Odiei sentir outra vez, mais uma vez, tudo o que eu jurara nunca mais sentir. Eu quebrei minha promessa. Eu me destruí quando você sorriu. E eu poderia destruir o mundo inteiro, se você quisesse. Eu não me importaria.
Foi injusto, amor.
Tudo estava tão bem. Em seu devido lugar. Meu nome sem manchas ainda gravado; meu coração reconstruído ainda batendo; você ainda longe de mim.
E com um sorriso, você mutilou minha alma. Minha alma, ou o que restara dela.
Um sorriso, e tudo à minha volta desmoronando.
Um sorriso, e tudo à minha volta explodindo.
Um sorriso. Eu em ruínas.
Um sorriso...
E então, eu soube: eu estava à sua mercê.
Eu sempre estive, meu amor.

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Declaração silenciosa

Tantos outonos melancólicos e invernos nostálgicos depois, eu posso dizer que tentei. Tentei pôr em palavras o calor do seu abraço, a musicalidade da sua voz, o brilho do seu sorriso e o quanto ele ilumina meu dia. O resultado é sempre o mesmo: frustração e orgulho. Porque eu não consigo te explicar. Porque você é inexplicável.
Mas se então eu conseguisse narrar minuciosamente a sensação de te ter por perto, se eu pudesse solidificar um sentimento imensurável, de que serviria? Você não estaria aqui para ler. As palavras que o coração não diz tornam-se inúteis uma vez postas no papel. E você não leria.
Você nunca saberia que eu te amei em silêncio.

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Short Story II

Esse texto NÃO é a continuação de Short Story I.
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Era uma vez uma garota e um garoto. Eles não eram irmãos, mas muita gente achava que eram. Se pareciam muito: tinham a mesma idade e o mesmo sorriso e sempre se sujavam quando tentavam comer cachorro-quente.
De vez em quando, ele olhava o rosto dela com assombro e admiração, como quem aprecia uma pintura fantástica rara que de repente apareceu bem do seu lado no sofá. Porque ela era realmente fascinante, embora ele nunca admitisse isso, é claro. Não admitia porque ela nunca olhava pra ele. E ele sabia disso, porque passava muito tempo olhando furtivamente pra ela, e os olhares nunca se encontravam. Acabava por aceitar que, provavelmente, eram realmente irmãos. Não de sangue, talvez. Mas algo como amigos que jamais deveriam olhar um para o outro com olhos de um amor que nunca fora fraterno.
O que ele não podia imaginar é que os olhos dela eram um diário. Um precioso livrinho que nunca ficava sem ela por perto. E era através de páginas que ela olhava pra ele. Mas ele não sabia. Ele nunca saberia; não se dependesse dela. E, de qualquer forma, se soubesse, qual seria a vantagem? Ela não achava que ele pudesse olhar pra ela. Era um absurdo - um crime - imaginar ou suspeitar tal coisa.
Permaneceram em mútua ignorância por longos anos. Cresceram. Muitos invernos passaram sem que eles percebessem. Até que, numa noite chuvosa como outra qualquer, onde tudo parecia absolutamente normal e não havia indício algum de que coisas estranhas poderiam acontecer, ela acordou de repente. E, por alguma razão, sabia que devia esperar que alguma coisa, qualquer coisa, acontecesse.
Deixou a casa sem pressa, caminhando como se a grama onde os pés nus pisavam fosse sagrado. Por algum tempo, nada aconteceu. Então o portãozinho de madeira sem adornos se abriu. Ele não parecia surpreso de vê-la ali - talvez com medo, ela não saberia dizer -, mas demorou para se aproximar. Carregava um pequeno livro, o diário dela, na mão trêmula. Quando já estava perto o suficiente para tocar seu rosto, ele levantou o diário como se o exibisse, e falou, e sua voz parecia música.
"Eu sempre olhei pra você."

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Suficiência.

Eu me refiz. Porque eu caí, mas eu levantei, e eu me refiz. E refazer-me bastava.
Olhar pra trás me traria muito mais dor do que eu poderia aguentar, então eu prossegui. E caminhar sem você foi pior do que eu podia imaginar. O conhecimento da sua covardia era minha única força; sua traição me impulsionou. E era o que bastava.
Será que eu posso dizer que vivi depois de você? Eu acho que sim. Eu tive ombros onde chorar, eu tive ouvidos para desabafar - mais do que isso, eu tive amores. Haveria mais o que pedir? Não. Eu os tive, e apenas o seu olhar bastava.
A estrada foi mais tortuosa do que parecia, mas eu continuei. Não mais por você. Eu continuei por mim, pela minha honra, pelo meu nome. Pela minha alma. E só isso era suficiente. Só isso bastava.
Cheguei ao fim. Eu, que pensei que não sairia do lugar onde você me deixou; eu cheguei ao fim.
Porque eu sou diferente de você, e é essa diferença que me faz melhor do que eu jamais poderia ser. Me faz melhor que você. E isso, meu querido - isso basta.

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10 words story

Foi assim que, silenciosamente, Ela e Ele confessaram mútua dependência.

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Palavras que eu nunca disse

E eu, que achava que te conhecia tão bem.
Olhe pra trás. Sinta um pouco de remorso. Tente ser nada mais que um humano. Diga que quer voltar. Que sente muito. Que tem vontade de jogar tudo pro alto e ser outra vez meu perfeito saquinho de pancadas.
E se eu dissesse que ainda te espero? E que, apesar da dor que você me fez sentir, eu seria capaz de reviver cada momento? Você voltaria? Você viveria para sempre comigo, mesmo que o pra sempre só exista em contos de fadas? Será que, outra vez, você seria o meu mundo?
Eu acho que não. Eu acho que não...
Se ao menos você pudesse lembrar dos nossos sonhos bobos e promessas infundadas... se pudesse aceitar que eu nunca vou poder ser quem você quer que eu seja, nem quem você merece que eu seja... se, ao ouvir o farfalhar do vento sussurrando ao longe, você lembrasse do meu próprio murmúrio afirmando centenas de vezes que nunca houve outro que me fizesse rir tão alto...
Então, meu amor - então você perceberia que ninguém, nunca, poderia amar você como eu amei.
E, talvez, o outono seria uma época feliz outra vez.

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Em frente, enfrente.

Em todos os dias da minha vida, eu vivi.
Vivi dias e noites, verões e invernos, amores e ódios. Vivi o murmúrio do vento nas árvores, o sorriso do sol, o doce cheiro da chuva. Vivi gritos desesperados, lágrimas salgadas, sangue fluindo. Vivi o milagre de ser.
Descobri a maravilha do perdão, a sutileza de um sorriso e o conforto de um abraço. Aprendi a delicada arte da frieza, o lento aperfeiçoamento da ironia; a fingir que não me importo. E, muitas vezes, não me importar mesmo.
Desejei o mal e o bem. Vaiei e aplaudi.
Gritei e chorei quando tive vontade. Menti, e você não sabe o quanto. Em gritos ou em sussurros, eu disse o que sentia. Com lágrimas ou com risos, eu mostrei a fragilidade infantil escondida por trás da fortaleza que cobria meu rosto.
E amei.
E amei você, mais do que devia.
A vida me fez forte, mas nada me impediu de cair. Agora, outra vez, eu vou me reerguer. E outra vez, e mais uma; e quantas mais? Quantas vezes cair, até alcançar a batalha final entre viver e existir?
Eu estou pronta. Pode começar a contar.

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Os meus sete pecados capitais

1. Você.

2. Você.

3. Você.

4. Você.

5. Você.

6. Você.

7. Você.

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Lembranças

Hoje eu lembrei de você, de novo. E veja bem, era teste de Física. Física. Você tem noção disso? Você está arruinando minha vida acadêmica, garoto.
Mas lembrei de tudo mesmo: de como você ri engraçado, do jeito muito seu de fazer caretas, das besteiras que você diz só pelo prazer de dizer. E de quando você soltou um terrível "legal" pra garota que disse que te amava, lembra? Tudo bem. Você não combinava com ela. Você combina comigo.
E quando você ficou com medo dos fantasmas e quis sair correndo! Eu fiquei com medo também. Eu não queria que você fosse embora. Eu não quero que você vá embora agora, tampouco.
Lembrei do seu sorriso tímido. E do seu calombo estranho no peito. E das muitas vezes que você ligava pra perguntar se eu tinha visto as salsichas; e sempre ficava irritado quando eu respondia que não só tinha visto, como comera todas. Era mentira. Eu só queria ver como você ficava ainda mais incrivelmente lindo nervoso.
Eu também me apercebi de detalhes valiosos. Você sabia que tem uma pintinha no cotovelo? E que quando sorri, seus olhos sorriem junto? E que você faz cara de paisagem quando não está entendendo nada?
Eu posso fechar os olhos agora e te ver de todos os ângulos, em todas as situações possíveis. Posso te imaginar e te desenhar na minha cabeça, e sentir seu cheiro, e quase tocar o seu cabelo.
Eu poderia viver só pensando em você. Eu não reclamaria.
E afinal, qual é o propósito de viver, se não for por você?

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Short story

Aquele era o seu dia.
Tinha perdido o celular, a carteira de identidade, um diamante negro recém comprado e algumas moedas que não vieram no troco. Sentada na calçada, fones gritando no ouvido, tênis sujos de lama, cabelos desgrenhados, ela fingia pra si mesma que mantinha uma séria conversa com seu furão fêmea. Estava prestes a perguntar "mas me diga, Zukia: você roubou ou não meu chocolate?", quando um grupo de estudantes passou fazendo bagunça do outro lado da rua. Ela sabia que estavam fazendo uma grande bagunça mesmo, porque podia ouvir os gritos mesmo com o volume do mp4 cansado no máximo.
Que bobos, ela pensou, sentindo um súbito orgulho por sua maturidade. Depois lembrou de como deveria estar parecendo, o esmalte descascando e delineador absurdamente borrado. Zukia lançou um olhar severo à dona, como se estivesse pensando a mesma coisa - especialmente porque estava deitada sobre um jeans muito sujo e surrado, que obviamente não estava à sua altura. A garota não deu muita atenção. "Desculpe, amor", ela murmurou, "mas hoje não é o seu dia." Depois começou a cantar (muito desafinada, é bom que se diga), de forma que nunca viu a cara de horrorizada de Zukia.
A música se encaixa muito bem, ela pensou distraidamente. Apropriada. É essa a palavra.
Um fumante acabara de passar. Ela o olhou, meio admirada, meio contrafeita. Admirada porque ele parecia a figura mais sedutora e inteligente do mundo fumando. Contrafeita porque nunca gostou de fumaça. E quem gosta, afinal?
Agora uma grávida. Nunca terei filhos. Vou ser uma pessoa inteligente e usar pílulas e camisinhas. Arranco meu útero, se necessário. Pensou tudo isso porque a barriga dela estava muito grande. Depois achou que um só seria legal. Ou gêmeos. Gêmeos com ele seriam lindos. Uma menina e um menino. Ela com os cabelos dele e os meus olhos; ele com os meus cabelos e os olhos dele. E os dois com bochechinhas vermelhas. Alice é um nome legal. Charlie, também. E ela vai se vestir como uma mini rockstar, e ele, como o meninão que o pai é. Então percebeu que tudo que estava falando era uma grande besteira, porque ela nunca seria mãe mesmo.
E por um longo tempo nada de muito interessante aconteceu, exceto que um cachorrão tentou latir para Zukia, e ela saiu correndo atrás dele e o perseguiu por vários minutos. Doida de pedra, a garota pensou. Zukia olhou para ela como se dissesse "Aprendi com você", mas, de novo, não surtiu muito efeito.
Agora era ele que passava, e, por um segundo, ela tentou sumir - mas, de que adiantaria, mesmo que eu conseguisse? É o que eu quero. Quero vê-lo. Quero que ele me veja também. Então, que diabos estou tentando fazer?
Bom, ele olhou, de qualquer forma. E pareceu tentar sumir, também. Não tendo muito mais sucesso que ela, sorriu minimamente. Caminhou até a calçada com passos tímidos e sentou ao lado dela. Ficaram em silêncio, os dois fitando Zukia, que parecia achar muita graça na situação. Para ser justa, acho que também estaria rindo. Bem! Não estamos indo a lugar algum. Acho que seria melhor que eu falasse. Talvez algo como "Oi". "Oi" definitivamente funcionaria. É o que vou fazer. Um, dois, três.
Quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez!
Onze, doze - ah, não seja estúpida agora. Certo. Assim que eu disser "já". Então, um, dois...
Saiu antes. "Oi." Ele olhou meio surpreso. Permaneceu quieto. Ela tentou imaginar se seu "Oi" saíra com uma entonação errada, mas parecia muito certo. Sentiu o rosto arder e olhou para Zukia outra vez. E demorou muito tempo para assimilar o que ele disse depois disso.
"Eu também gosto de você."
Porque aquele era o dia dele, afinal.

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